28 agosto 2014

Ele roubou meu caminhão.

O teto estava cada vez mais próximo, como quem vai sufocar.
Ela - eu, já tão viciada em tédio, nem se abalava.
Era rotineiro, costumeiro, insólito estar ali.

Ela - eu, vivia em um conto de Bukowski.
Entre um trago e outro trocava os lençóis.
Não restava mais álcool e ele a odiaria por isso.

Já não havia traço de luz.
Ela - eu era toda breu.

Como quem invade o quarto chutando a porta ele entrou.
Não veio sutil, não pediu permissão.
O garoto laranja se apossou de tudo a seu redor.

Ela - eu sorriu com dentes de pérola.
Amarelados.

Ele segurou seu - meu rosto.
Roubou o ar, sugou, beijou.
Línguas, lábios, saliva.

Eu hesitei, tentei fugir.
Não era hora de deixar ninguém entrar.

Mas o garoto laranja era mais esperto...
Disse que eu lhe dei todas as armas para lutar.
Então, ele roubou meu caminhão.

28 abril 2014

Desadormecer.

A tempestade passou deixando um tapete de estrelas no céu.
Embaixo dele as luzes da cidade oscilam entre o laranja e o azul.
Tudo é mais claro e calmo, como quando vejo você dormir.

Já não é mais um fardo viver insone.
Tenho agora o som da sua respiração como companhia.
E tudo me parece mais agradável.

Tolice a minha acreditar que passaria impune à sua presença.

_Diabos, que sorriso!

Eu poderia listar mil motivos, que sussurram à minha janela,
  para que eu tivesse me apaixonado.
Mas se faz desnecessário sempre que você segura minha mão,
  entorpecido pelo sono.

Tenho vivido em estado lisérgico,
  desde o dia em que seus lábios pálidos tocaram os meus.
A gargalhada ecoa solta por todas as esquinas,
  preenchendo de cores até os prédios mais insólitos.

Do fundo do breu, sua voz se faz súplica...
Pede para que eu abra os olhos.
E diz que o sonho ficou no sofá, naquela quinta feira.
Hoje nós estamos acordados e era só isso que nos faltava para viver.

20 abril 2014

Retrato em PB.

É tão cedo ainda e seus acordes já me acordaram.

Quando desperto, a primeira coisa que procuro são eles.
Que me pregam peça, dançando entre o verde e o azul, olhando fundo em mim. 
Sussurrando coisas que ainda não entendo.

Estamos correndo livres no frio, eu com sua calça de flanela, você com a maldita touca que nunca conseguiu colocar do lado certo.

(Droga, eu sempre sorrio quando você faz isso.)

Não precisamos mais mendigar amor pelas ruas NYC.
Sua timidez canta coisas lindas, enquanto as folhas de outono caem sem pressa.

Os nossos reflexos se espalham por toda a cidade e nós somos como um retrato em PB.
Eternizados em carteiras, murais, bolsos e memórias.




(E se eu posso pedir alguma coisa ao vento é que o brilho jamais se apague.
Desejo que o nosso riso jamais se cale.
E peço ao tempo encarecidamente, que os olhos, as mãos e a pele nunca deixem de se tocar...
Como no dia em que nos conhecemos.)







18 abril 2014

O meu adeus à Gabriel García Márquez.

Nem cem anos de solidão, nem toda cólera do amor, nem a memória das minhas putas que hoje também estão tristes, saberiam como contar um conto da crônica de uma morte anunciada...
Hoje só me sobram o amor e outros demônios nessa revoada tão bonita e sim, com lágrimas nos olhos.
O adeus breve que hoje bate a minha porta fica imortal nas minhas lembranças.
Que novas linhas sejam traçadas onde quer que você esteja. E eu fico aqui, ansiosa pra chegar o dia em que as lerei!
Obrigada por "haver" Gabriel García Márquez!

16 março 2014

Rosso.


Ele se fez único e vermelho, como não poderia deixar de ser.
Coloriu meu corpo assim que o tocou.
É o complemento perfeito para o verde que habita em meu peito.
Decantaram em mim seus aromas mais raros, suas notas cítricas viciaram meu paladar.

Seus olhos me tiraram para dançar e o cheiro de carvalho inundou tudo ao nosso redor.
E quando seus lábios tocaram minha nuca, a sala toda se iluminou.
Aquelas sardas ficarão guardadas para sempre no álbum da minha mente.
E esse ar de anjo não me engana.
Sei que é um demônio quando se trata de amor.


11 março 2014

Qual a sua Graça?


Ela é minha diva, meu divã;
nela me recosto, reviro,
entre os braços, que me guardam.
Meu estado mais benevolente,
ela vem do Latim. "Ella" é meu jazz...
É samba de rainha.
É Vinicius em estado de graça.
É meu tom, meu Jobim.
A moça da pele preta, do sorriso aberto.
A risada mais gostosa e escancarada.
Qual o quê... É Chico!
É bossa, é blues...
Reverberam em mim os sons que ela pode ter...
De todas que ela pode ser, ela é a minha... graça.
Qual a sua?